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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

O Código de Ética Profissional e a Psicóloga Cristã





            De tempos em tempos vejo algum burburinho em torno das declarações da senhora Marisa Lobo (“Psicóloga Cristã”) nas redes sociais. Particularmente não sou de dar muita audiência para pessoas ou blogs desse tipo, mas sendo um profissional da área é inevitável não ler alguma coisa sobre o que ela anda dizendo.
Sou psicólogo, entrei na faculdade de Psicologia no ano de 2006. Logo nas primeiras semanas, no meio de um debate em sala de aula, uma professora nos disse que, a partir do momento que ingressamos na graduação, já nos submetíamos aos dispositivos do Código de Ética da profissão.
            O Código de Ética Profissional do Psicólogo gerou e subsidiou inúmeras discussões ao longo do curso, algumas bem calorosas e que, obviamente, envolviam religião, sexualidade, política, profissionalismo, entre milhares de outras questões inerentes ao trabalho do psicólogo.
            Ao longo de minha formação aprendi, e assim o faço até hoje, a compreender o Código como NORTE e não como uma lista de regras. O Código expressa um conjunto de valores e princípios que são fundamentais para o exercício da função e nos dá a dimensão exata da responsabilidade que cada profissional tem para com as pessoas e para com a sociedade no exercício dela.
            Assim, de tudo o que eu li até hoje, afirmo sem sombra de dúvidas que Marisa Lobo, para promover suas opiniões, distorce o Código de Ética do Profissional Psicólogo, deturpa textos científicos, falta com a verdade quando fala a respeito de proposições que tramitam nas Casas Legislativas do país e das bandeiras defendidas pelos movimentos sociais, e reúne uma rede de fundamentalistas contra todos os que a questionam.
            Recentemente, Marisa Lobo foi chamada ao Conselho Regional de Psicologia do Paraná para prestar esclarecimentos sobre sua atividade profissional, e após o ocorrido fez inúmeros comentários nas redes sociais, mobilizando alguns segmentos para atacar a profissão e os movimentos sociais e se colocando acima de qualquer tipo de crítica.
            Para entender a situação é fundamental conhecer o que diz o Código, instrumento que deveria ser conhecido por todos, psicólogos ou não.
            Vejamos o que diz o texto: o Código de Ética Profissional já em seus princípios fundamentais afirma que cada psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos. E que trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (CFP, 2005, p.7).
            Ou seja, o profissional de psicologia atua na sociedade e exerce sua profissão de maneira a garantir e promover os Direitos Humanos, nos sendo vedada qualquer tipo de ação que colabore, mesmo que indiretamente para a marginalização de qualquer grupo ou pessoa.
            Indo mais adiante, o CE dispõe em seu primeiro artigo:
Art. 1º – São deveres fundamentais dos psicólogos:
c) Prestar serviços psicológicos de qualidade, em condições de trabalho dignas e apropriadas à natureza desses serviços, utilizando princípios, conhecimentos e técnicas reconhecidamente fundamentados na ciência psicológica, na ética e na legislação profissional;
Este dispositivo estabelece o conhecimento científico como parâmetro para a atuação do profissional psicólogo, ou seja, seu exercício está condicionado ao domínio de métodos e técnicas validados e comprovados cientificamente, e que possam ser questionados da mesma maneira, pela ciência.
Independente da fé que professa, ao exercer sua profissão, o psicólogo se pautará pela ciência, sempre!
O segundo artigo determina que:
Art. 2º – Ao psicólogo é vedado:
a) Praticar ou ser conivente com quaisquer atos que caracterizem negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade ou opressão;
b) Induzir a convicções políticas, filosóficas, morais, ideológicas, religiosas, de orientação sexual ou a qualquer tipo de preconceito, quando do exercício de suas funções profissionais;
f) Prestar serviços ou vincular o título de psicólogo a serviços de atendimento psicológico cujos procedimentos, técnicas e meios não estejam regulamentados ou reconhecidos pela profissão;
            Este artigo reforça o compromisso do psicólogo com os direitos humanos, impede que psicólogos se utilizem de sua profissão e da relação que estabelecem com seus atendidos para induzi-los a compartilhar de suas convicções, além de impedir que vinculemos nosso título a qualquer outra coisa que não se relacione a profissão, ou seja, religião, política, time de futebol, gosto musical entre milhões de outras coisas.
Marisa Lobo em frente a sede do CRP/PR
Em resumo, o Código o reafirma que em todo lugar em que o profissional se apresente como psicólogo, o deve fazer com base no conhecimento científico, nos métodos e técnicas advindos da Psicologia e respeitando os Direitos Humanos.
            Marisa Lobo, que se tornou conhecida por se utilizar da profissão e do título acadêmico que possui para fazer proselitismo religioso, promove reiterados ataques aos movimentos por direitos humanos (com ênfase ao LGBT), às religiões de matriz africana, aos ateus e ao sistema de Conselhos de Psicologia.
Sabedora das infrações que comete, Marisa Lobo se esforça para se passar por vítima de um Conselho dominado por militantes intolerantes, postura fica nítida na foto em que posa em frente à sede do CRP/PR de bíblia em punho, numa tentativa de tornar uma discussão sobre sua conduta profissional em um debate religioso.
            Sobre o processo que corre no CRP/PR, Marisa Lobo afirma que o Conselho exige que renuncie seu deus, renegue sua fé para exercer a profissão de psicóloga, numa clara distorção da verdade, expediente bem comum em seu blog e em suas postagens nas redes sociais.
Nas declarações que deu sobre o processo, Marisa Lobo em momento nenhum se defendeu, não desmente o que é colocado, ao contrário, ataca ainda mais os homossexuais, ateus, entre outros seguimentos e novamente tenta se passar por vítima. Publicou alguns trechos na internet, e em NENHUM momento há a orientação para que ela deixe de freqüentar sua igreja ou suspenda seu trabalho missionário, o que existe é a exigência de que ela separe sua atuação profissional das atividades religiosas em que está envolvida, que deixe de utilizar do título de psicóloga para defender sua fé e misture ciência com religião.
Trechos do Processo de Lobo no CRP/08
Aos psicólogos, como a qualquer outra pessoa é garantido o direito de professar a sua fé e praticar sua religião, mas isso deve ser feito nos lugares e momentos adequados e de forma alguma deve ser associada ao exercício da profissão. Ao contrário do que Marisa Lobo tenta provar, é possível ser psicólogo e ter vida religiosa sem que uma coisa anule a outra.
Logo, fica claro que Marisa Lobo distorce e deturpa qualquer informação ou texto para atender seus interesses políticos/religiosos. Submete os interesses da profissão à sua agenda religiosa, incorre em falta ética, e deve ser responsabilizada por isso.
Como disse aqui, o Código afirma em seus princípios o compromisso com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, declaração esta que garante a liberdade religiosa como direito fundamental. Serve para nortear a atuação de todos os profissionais de Psicologia, independente de sua fé religiosa, convicção política, orientação sexual, o Código se aplica a todos e nenhum profissional está acima dele.
Espero que a situação no CRP do Paraná se resolva rapidamente, que a profissão saia fortalecida e nossos princípios sejam preservados!


PS: Por gentileza assinem petição contra a PEC 99 que quer dar poderes a instituições religiosas cristãs de propor ações diretas de constitucionalidade e inconstitucionalidade ao STF e defende a laicidade do Estado: CLIQUE AQUI 





10 comentários:

  1. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

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  2. Psicóloga cristã?!Era só o que faltava mesmo!
    Haha
    Realmente Flávio...muito triste! a impressão que tenho é que estas pessoas dão um passo para trás...esquecem tudo que aprenderam em cinco anos e se entregam ao senso comum novamente!

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  3. Parabéns Fábio, muito pertinente a abordagem deste tema e mais ainda seu posicionamento frente a esta patifaria... Por muito menos profissionais que levam a Psicologia realmente a sério estão sujeitos a perder o CRP... É esperar pra ver o desfecho dessa história!

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    1. Obrigado Amarildo!

      Creio que essa história vai longe, mas em casos semelhantes o sistema de Conselhos não se omitiu, assim foi com a Rozângela Justino, no CRP do Rio, que oferecia cura de homossexuais pela oração e mais recentemente com o Odair Simões no CRP de SP. Nosso Código de Processamento Disciplinar é bem complexo, mas acima de tudo justo, assegura ao profissional o direito de defesa e contraditório, por isso as vezes demora um pouco.

      Agora é acompanhar o desenrolar da história, manter o debate sobre ética profissional no nosso dia-a-dia.

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  4. Gostei muito do post. Você será muito bem vindo em visitar meu blog

    um abraço

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    1. Obrigado, visitarei seu blog com muito prazer! Seja bem vindo por aqui!!!

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  5. luana,discordar da psicologia cristã estar no seu direito, agora zombar ridicularizar, um pensar diferente, se pergunte se ético? as verdades nao passam de contruçao históricas e politicas. Não levanto bandeira nem A nem de b, apenas repudio o zombar por pensar diferente!

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    1. Eu sinceramente não descobri ainda onde foi que você viu ofensa ou zombaria no comentário da Luana.

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  6. http://bauhausculturaemusica.blogspot.com/2012/02/ideias-canhotas-o-codigo-de-etica.html

    Eu postei o seu post no meu blog. Parabens novamente pela iniciativa.
    Deus abençoe a Liberdade de Expressão

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  7. Já postei no meu blog o seu post. Novamente parabens pela sua iniciativa

    http://bauhausculturaemusica.blogspot.com/2012/02/ideias-canhotas-o-codigo-de-etica.html

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